quarta-feira, 21 de julho de 2010

Discos comprados 09


SÓ DANÇO SAMBA - Emílio Santiago - Depois de despontar no cenário musical na década de 70 com discos absolutamente estupendos (destaque para Feito para ouvir, de 1977) e tendo um timbre de voz invejável e uma técnica apurada e perfeita, Emílio tinha tudo para ser o maior cantor brasileiro. E talvez até seja mesmo, só que nem todo o mundo concordando com isso por conta do seu repertório, este sim nem sempre à altura da sua voz, nem sempre atendendo a algum critério de qualidade. Talvez por pressão do mercado, o cantor em 1988 gravou um disco chamado Aquarela Brasileira, misturando sambas de enredo com pop rock, Paulo Vanzolini com Caetano Veloso, Rita Ribeiro com Ary Barroso. O resultado agradou e, sem qualquer pudor, vieram os volumes dois, três, quatro, cinco, seis e sete! Tudo isto somado a coisas como "Saigon", "Verdade chinesa" e "Logo agora" deram a Emílio uma aura cafona da qual ele luta firmemente para se livrar. E há de conseguir. Porque seu mais recente disco, este aqui, é nada menos do que sensacional. A mistura de sempre - que deve satisfazer ao próprio artista e, só por isso, já merece respeito - permanece forte, donde haja neste disco obras de Mart'nália, Dona Ivone Lara e Tom Jobim, por exemplo. Só que a unidade ao trabalho vem dos arranjos, calcados na sonoridade dos órgãos típicos dos anos 70. Não, não e não... não se está falando aqui dos sintetizadores dos anos 80, que emulavam orquestras e baterias inteiras... tampouco refere-se aqui ao órgão azucrinante da Jovem Guarda, de onipresença irritante. O órgão que ajuda a embalar a voz de Emílio é discreto, sensual e, estando aliado a um bom piano, a um sonoro violão, a um baixo preciso e a eventuais solos de sopro, só fazendo bem ao disco. E como Emílio Santiago está cantando bem, minha gente! Difícil escolher uma faixa que se destaque, porque todas são muito bem trabalhadas e o canto do crooner soa tão natural quanto perfeito. É verdade que muita gente gosta da fase aquarelada de Emílio - avós servem também para isso -, mas comprem este disco e conheçam um outro lado, muito mais chique, muito mais sofisticado, muito mais digno do dom musical que ele tem.

BANGÜÊ - Ilana Volvov - E tem espaço para mais uma cantora no Brasil? Há compositor para tanta mulher que canta? Há mercado fonográfico que sustente tantas meninas novas? Sim, sim e sim. Se houve espaço para Aydares, Carams e Cañas, há de háver para vozes menos pasteurizadas, para discos menos frios, para a música mais sincera. Afeto e sinceridade são marcantes neste disco de Ilana, que surpreende por uma sonoridade tradicional, o que hoje, invelizmente, já não se espera de uma cantora jovem. Não se ouvem no disco batidinhas eletrônicas, vozes distorcidas ou sons tirados de objetos estranhos. O que se tem, de fato, é muito violão, muita flauta e muita clarineta. E a ousadia?, perguntarão os que acham que todo jovem tem que ser ousado. A ousadia está em se gravar Capiba em pleno início do século XXI, tempo farto que tem assistido ao surgimento de ótimos compositores de MPB. Não que Ilana os ignore - certamente não -, mas prefere gravar Noel, Capiba, Paulinho da Viola e Hekel Tavares. Ponto para ela, que conseguiu fazer um disco coeso, sem deixar de se mostrar versátil; tradicional, sem parecer antigo ou antiquado; suave, sem resvalar na fragilidade; intenso, sem que seja agressivo. Mérito da cantora, que conseguiu construir um trabalho baseado na sinceridade musical. Embora o timbre da cantora não me seduza completamente, porque um tanto suave demais (meio a la Salmaso), não se pode negar sua beleza. Comprem, que vale a pena!

AMIGO DE FÉ - Cláudio Jorge - O que acontece quando um músico de qualidade resolve gravar um disco como cantor? O de sempre: um disco belamente arranjado, com composições (quase todas suas) de ótimo nível, mas com um cantor que não chega lá, diga-se assim. A bem da verdade este disco nem é tão novo assim. Já tinha sido lançado há algum tempo, vivia esgotado e, agora, a Biscoito Fino resolveu devolvê-lo ao mercado em nova edição. Ótima ideia, porque se trata de um ótimo disco e, embora o violonista Cláudio Jorge não tenha na voz a mesma habilidade que tem ao violão, ele se sai bem cantando samba. Como se pode notar ao se ouvir faixas como "Estrelinha e conchinha" e "Lundu de cantigas vagas". Mas a sensação que se tem ao fim do disco é que as composições de Cláudio clamam por intérpretes de verdade, para que sejam devidamente trabalhadas e embelezadas. Foi o que já aconteceu com "Melhor assim" (estourando atualmente na brilhante interpretação de Teresa Cristina) e "Coisas simples" (gravada há pouco tempo com maestria por Ana Costa). Que outras cantoras gravem Cláudio Jorge! E que se dê valor a este compositor, tão afeito à tradição do samba, tão prolífico.

E O QUE MAIS AFLORE - Gonzaga Leal - Vai parecer redundância, porque já falei dele aqui, mas o que mais se destaca no trabalho de Gonzaga Leal é o capricho que ele imprime em seus trabalhos. E, neste disco, o capricho vai ao extremo: das fotos para o encarte, aos arranjos do disco. dos textos que complementam o conceito do disco, às participações especiais. E vale comentar também o fato de o disco trazer dez faixas de domínio público. O que isso quer dizer? Quer dizer que Gonzaga bebe na fonte da cultura popular na hora de criar sua tão sofisticada arte, mostrando que o que vem do povo e o que a ele se devolve não precisa ser rasteiro ou simplório. Pelo contrário: o luxo dourado que este artista apresenta em forma de CD vem justamente do popular. E o mérito de Gonzaga está em embaralhar essas canções entranhadas nas pedras das ruas das cidades antigas com pérolas de craques de todos os tempos, como Ataulfo Alves, Roque Ferreira e Roberto Mendes, por exemplo. Daí ele se cerca de músicos incensuráveis, chama para participar do disco gente como Marcos Sacramento e Dominguinhos e, pronto, faz um disco perfeito.

1. SÓ DANÇO SAMBA - Emílio Santiago
2. O NAMORICO DA RITA - Ilana Volcov
3. ESTRELINHA E CONCHINHA - Cláudio Jorge
4. DE MADRUGADA - Gonzaga Leal
5. TENDÊNCIA - Emílio Santiago
6. ENCONTRO - Ilana Volcov
7. COISAS SIMPLES - Cláudio Jorge
8. SAUDADE DO MEU BARRACÃO - Gonzaga Leal
9. SAMBA DE VERÃO - Emílio Santiago
10. PROCISSÃO DA PADROEIRA - Ilana Volcov
11. LUNDU DE CANTIGAS VAGAS - Cláudio Jorge
12. ÚLTIMA ESTROFE - Gonzaga Leal
13. SAMBOU, SAMBOU - Emílio Santiago
14. QUANDO O SAMBA ACABOU - Ilana Volcov
15. MELHOR ASSIM - Cláudio Jorge
16. HOJE SEI QUE VOLTO - Gonzaga Leal
17. CHEGA - Emílio Santiago
18. CONTRADANÇA - Ilana Volcov
19. LEMBRANDO CAXINÊ (ROSA MARIA / TUDO É ILUSÃO) - Cláudio Jorge
20. SAUDAÇÃO A OXOSSI / OXOSSI - Gonzaga Leal

Um comentário:

Anônimo disse...

Link invalido , poderia atualizar por favor ?